Saúde da mulher

Sexualidade na gravidez e pós-parto: desejo, medos e tabus

Percurso sexual no pós-parto não permeia somente no âmbito fisiológico e genital, mas sim na totalidade da mulher

Foto: Jô Folha - DP - “A mulher não pode se sentir mal, deve respeitar o corpo e os seus limites”, diz a ginecologista, obstetra e terapeuta sexual Kim Sanguiné

Por Joana Bendjouya

A gravidez, logo após o parto e o período da amamentação, podem levar a alterações no corpo e na mente feminina, que geram impacto também na sexualidade desta mulher que, durante a gestação, é inundada por hormônios que são capazes tanto de inibir quanto aumentar o desejo sexual. Além disso, as mudanças físicas, que são percebidas no corpo e a barriga quando já crescida podem também trazer desconforto.

A ginecologista, obstetra e terapeuta sexual Kim Sanguiné de Souza explica que ainda há muitas dúvidas e preconceitos em relação à prática sexual durante a gestação e no período logo após o nascimento do bebê, mas que o fundamental é respeitar cada momento da mulher e a relação existente entre o casal. “A gravidez é uma fase difícil, muita coisa muda para esse casal. Mudanças fisiológicas e hormonais. Levo muito a sério a sexualidade, e inicio todas as consultas de pré-natal falando isso, que é possível e muito importante manter a vida sexual durante a gravidez. Mas informações erradas que foram disseminadas atrapalham muito a vida sexual de muitos casais”, salienta.

Kim explica que, de fato, na gestação, as alterações hormonais que caracterizam o período podem ocasionar para algumas mulheres a perda total ou parcial da libido, enquanto outras vivem o contrário. Da mesma maneira ocorre no puerpério, ou até mesmo nos primeiros anos de vida da criança.“Dois hormônios importantíssimos na gravidez que ficam aumentados, a progesterona e prolactina, eles inibem o desejo. Então é normal isso acontecer, é importante respeitar as vontades e limitações da gestante, assim como é importante que este casal viva a sua sexualidade. Isso, inclusive, irá ajudar na conexão deles futuramente”, orienta.

A médica explica ainda que, neste período, ocorrem também medos como o de ferir o feto, de iniciar um parto prematuro, até de causar algum mal ao bebê. Além disso, algumas mulheres podem não ter vontade de fazer sexo por não reconhecer o próprio corpo ou ter dificuldade de encontrar uma posição confortável, o que exige paciência e criatividade do casal, que além disso está se adaptado às novas responsabilidades que irão vivenciar daqui para frente. “Para as mulheres, além das transformações psíquicas e hormonais, elas têm que lidar com tudo que acontece no corpo. Ela está se vendo com uma barriga maior, seios maiores, podem ficar mais sensíveis ou até mesmo doloridos ao toque. Às vezes surgem estrias, ela está trabalhando com a aceitação deste novo corpo.As mudanças começam quando se descobre a gestação porque esse casal experimenta o medo das complicações que podem acontecer durante a gravidez. Estão precisando dar conta de uma mudança também de papéis. Eles antes eram namorados, eram amantes e agora começam a se adaptar com ideia que vão ser pais e que tem uma criança a caminho.”

Com a proximidade do parto, outros fatores como dores nas articulações e na lombar, além da privação de sono, podem trazer desconforto e desinteresse neste período, o que além de comum é muito normal, conforme explica a ginecologista. “É importante manter uma sintonia entre esse casal de forma leve e saudável.Sempre ressalto para os casais que penetração não atinge o bebê e nem machuca a mãe, não causa parto prematuro. Pode,às vezes, acontecer ejeção de leite, mas não precisa se assustar com isso, é muito normal”, explica Kim.

A ginecologista garante que também pode, por vezes, ocorrer a perda de interesse pelo sexo no período subsequente ao nascimento do filho, pois além do corpo da mulher estar muito mais voltado a uma doação, tanto física quanto psicológica para aquele recém-nascido, há outros fatores em cena, como a variação hormonal, a nova rotina de vida estabelecida para aquela família, com o cansaço e adaptação as novidades. Além da recuperação do corpo desta mulher.

Kim ressalta ainda que o parto pode gerar sequelas físicas, como cicatrizes que por vezes podem ser dolorosas, tanto abdominal, se o parto foi uma cesariana, ou na vagina, no caso do parto normal.Então, entender e respeitar o tempo de cada mulher é essencial. ”Existe culturalmente a orientação da quarentena, aqueles 45 dias após o nascimento do bebêque, independente da via do parto, é indicado para resguardo. Porém, é permitido 15 dias após, se esta mulher estiver bem, se a recuperação estiver indo bem, e se ela sentir vontade, ela pode pode ter relações. Mas claro que cada uma tem o seu tempo. Não precisa ter pressa para retornar a vida sexual, é um momento delicado e às vezes até difícil para muitas famílias que estão se conhecendo e se reconhecendo neste papel de pais, além das preocupações com o corpo, com a recuperação deste corpo”, explica.

Sintonia e respeito é fundamental
“Os sentimentos são atingidos muito pelos hormônios, mas é importante ter consciência que primeiro virão as transformações do corpo. Após essas modificações, permanecem os sentimentos. Inicia com a vontade dessa mulher de ser mãe, seja soloou não. Mas muitas vezes, antes disso, existia um casal, seja ele homoafetivo ou hétero.As mudanças são grandes e muitas”, explica a psicóloga Marlise Flório Real.

Marlise ressalta ainda que essa oscilação pelo desejo sexual já é algo presente na vida mulher, anterior mesmo ao momento gestacional, que neste período pode ficar mais em evidência pela interferência de outros fatores que acompanham a gestação. “Podemos figurar que sexualidade na vida do homem é uma linha reta.Já para as mulheres, é desde sempre em ondas, tendo altos e baixos, mesmo antes de engravidar, e assim permanece.”

A psicóloga explica ainda que o desejo de ser mãe traz muitas mudanças e que se sentir acolhida é fundamental para a mulher neste período da vida. “As modificações que ocorrem, não só as emocionais, mas também podemos falar das visíveis, as mudanças do corpo, e essas o parceiro não passa.Muitas vezes, quando se trata de um casal homoafetivo de duas mulheres, ocorre uma empatia, pois a parceira já compreende as mudanças e alterações hormonais”, comenta. Além disso, a psicóloga enfatiza que respeitar os seus limites e a sua história é fundamental para que este momento seja vivido da melhor forma possível, entendendo que cada experiência é individual, tanto da mulher como do casal.

Marlise enfatiza ainda o cuidado com a idealização deste momento, que muitas vezes é projetado para ocorrer de uma forma e nem sempre acontece. Ou até mesmo tendo como referência a experiência de pessoas públicas registradas nas redes sociais, que nem sempre é a mesma realidade que aquela mulher está vivenciando. “Existe uma pressão externa muito forte para essa mulher, uma idealização da gestação do processo de recuperação pós-parto e uma urgência de retomar a sua vida o mais rápido possível. Mas é importante entender que não será como antes, que agora existe um bebê e muitas questões que interferem nesta rotina com esse novo integrante da família”, explica.

A psicóloga pondera que, à medida que o sono do bebê vai ficando mais organizado e adquirindo certa regularidade, o corpo da mulher se recuperando do pós-parto e ela vai se adaptando às novas condições, a tendência é a de que esse interesse pela sexualidade vá aos poucos retornando. “Esse processo é mais acelerado no homem muito em função do fato de que nele a mudança provocada pela gravidez acontece mais no nível emocional, psicológico, não no físico. A mulher, por sua vez, está ali, retornando de uma cirurgia, quando cesária, possivelmente amamentando, naquele cuidado de banhos e trocas de fraldas. Assim, demora um pouco mais a recuperar esse desejo. Aqui vale estarem atentos para a importância da rede de apoio para essa nova família.” Porém, ela esclarece que cada experiência com a maternidade e com a sexualidade é profundamente singular e individual. “Tudo isso irá depender da história de cada mulher com a maternidade, com aquele filho, com o próprio corpo, com a própria sexualidade e com o seu relacionamento”; ressalta.

Outro fator que Marlise atribuiu que possa vir a alterar o desejo sexual após o nascimento de um filho tem muito a ver com fatores de ordem prática da nova realidade. “O cansaço, o sono, o corpo que mudou, os papéis familiares que mudaram, assim como é a figura de presença, a participação, daquele companheiro ou companheira na divisão das tarefa, isso tudo tem um peso muito grande.”

Restrições
A primeira recomendação é sempre fazer uma avaliação com o obstetra para verificar se há alguma contraindicação para a atividade sexual. Se não houver, é importante conversar com o parceiro para buscar uma posição que seja confortável. Kim ressalta que a vontade da gestante deve ser levada em conta sempre. Caso ela não se sinta à vontade ou com desejo para manter relações sexuais, isso deve ser respeitado. “A relação sexual melhora a conexão emocional do casal, além de liberar endorfina, que melhora a sensação de bem-estar”, comenta a médica.

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